segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Dicionário Do Mofino 42

Colóquio, s.m. barbitúrico de uso corrente. Nos académicos provoca colateralmente dependência, logorreia, intolerância aos pares, síndrome de abstinência e actas.

domingo, 30 de outubro de 2011

Dicionário Do Mofino 41

Adúltero, adj. Pluralmente fiel; da definição precedente se infere que o corno é aquele que partilha com outrem a fidelidade do seu cônjuge. Jules Renard estranhava que este pequeno nome, corno, não tivesse feminino, parecendo sonegar o equânime princípio da paridade dos géneros gramaticais, vindicado pelos feminismos, e fazer deste retorcido vocábulo um género assexuado e embolado. Javier Marias definiu vividamente a fidelidade como a constância e a exclusividade com que um determinado sexo penetra ou é penetrado por outro igualmente determinado, ou se abstém de ser penetrado ou de penetrar noutros, mas a definição é demasiado visual e fescenina; a condição do adulto.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Dicionário Do Mofino 40

Dívida, s.f. substantivo acolitado amiúde pelo verbo contrair, tal como doença e casamento, que designa a obrigação de gratidão votada a quem emprestou e não anseia receber; a crer na Apologia de Sócrates, de Platão, as derradeiras palavras de Sócrates relembravam uma dívida por si contraída e apelavam a Críton para que a saldasse - Eu devo um galo a Esculápio, vais lembrar-te de pagar a dívida? Consta que Esculápio nunca lhe ferrou o dente, naturalmente porque Sócrates se esqueceu, Críton não se lembrou, e os deuses são falhos de dentes. A partir deste episódio, a História da Filosofia passou a ser a estória das dívidas contraídas e renunciadas.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Internacional Citacionismo - Teoria do Conhecimento

Poesia sobre a teoria do conhecimento
(epistemologia)

Era uma vez uma pequena
chamada Lia
que dizia
que quando um rapaz a convidava
a um coquetel
ela já sabia
o que ele queria.
Sabia
mas ia.

Millôr Fernandes

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Dicionário Do Mofino 39

Telemóvel, s.m. telefone sem fios que transformou o animal que fala, o zôom logikón segundo Aristóteles, no animal que fala demais, segundo o meu orelhame; objecto portátil e sortílego que, tornando audíveis os nossos monólogos, terá levado a sibilina Agustina a crismá-lo de objecto masturbatório sem pensar nas chamadas de valor acrescentado; materializador da distopia comunicacional falar com qualquer pessoa e ouvir qualquer pessoa em qualquer lugar, a qualquer hora e pela hora da morte.

sábado, 22 de outubro de 2011

Diário dos Perplexos

Caixa Geral de Depósitos tem 1300 milhões de Kadhafi

Jornal Sol

É sabido e consabido: o dinheiro pode provir de bordel, da estrumeiras tóxicas do sistema financeiro internacional, da embalagem de cocaína, do sangramento de povos e gentes, mas fica sempre irrepreensivelmente inodoro, incolor e insípido no mesmo lugar - os bancos. Já no século XVIII os bancos suiços eram famosos, e Voltaire recomendava: “Se alguma vez virdes um banqueiro suiço a saltar de uma janela, atirai-vos atrás dele. De certeza que se deverá ganhar dinheiro com isso.”

terça-feira, 18 de outubro de 2011

SeX Files - A Lei da Queda dos Graves

O sexo é um assunto da maior gravidade porque releva da queda indefesa dos corpos. Um corpo em queda, dois corpos em queda, três corpos em queda – física ou metafísica – geram sempre um sobressalto cómico, trágico, tragicómico.

"Eu acho que o sexo tem que ser entre pessoas que se amam, ou se gostam, ou se respeitam, ou então não se conhecem mas não têm nada para fazer entre as seis e as oito. Senão fica uma coisa mecânica, entende."

Luís Fernando Veríssimo

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

World Wide Protest - Zizek na acampada de Wall Street




Transcrição

Durante o crash financeiro de 2008, foi destruída mais propriedade privada, ganha com dificuldades, do que se todos nós aqui estivéssemos a destruí-la dia e noite durante semanas. Dizem que somos sonhadores, mas os verdadeiros sonhadores são aqueles que pensam que as coisas podem continuar indefinidamente da mesma forma.

Não somos sonhadores. Somos o despertar de um sonho que está a transformar-se num pesadelo. Não estamos a destruir coisa alguma. Estamos apenas a testemunhar como o sistema está a autodestruir-se.

Todos conhecemos a cena clássica do desenho animado: o coiote chega à beira do precipício, e continua a andar, ignorando o facto de que não há nada por baixo dele. Somente quando olha para baixo e toma consciência de que não há nada, cai. É isto o que estamos a fazer aqui.

Estamos a dizer aos gajos de Wall Street: “hey, olhem para baixo!”

Em Abril de 2011, o governo chinês proibiu, na TV, nos filmes e em romances, todas as histórias que falassem em realidade alternativa ou viagens no tempo. É um bom sinal para a China. Significa que as pessoas ainda sonham com alternativas, e por isso é preciso proibir este sonho. Aqui, não pensamos em proibições. Porque o sistema dominante tem oprimido até a nossa capacidade de sonhar.

Vejam os filmes a que assistimos o tempo todo. É fácil imaginar o fim do mundo, um asteróide destruir toda a vida e assim por diante. Mas não se pode imaginar o fim do capitalismo. O que estamos, então, a fazer aqui?

Deixem-me contar uma piada maravilhosa dos velhos tempos comunistas. Um fulano da Alemanha Oriental foi mandado para trabalhar na Sibéria. Ele sabia que o seu correio seria lido pelos censores, por isso disse aos amigos: “Vamos estabelecer um código. Se receberem uma carta minha escrita em tinta azul, será verdade o que estiver escrito; se estiver escrita em tinta vermelha, será falso”. Passado um mês, os amigos recebem uma primeira carta toda escrita em tinta azul. Dizia: “Tudo é maravilhoso aqui, as lojas estão cheias de boa comida, os cinemas exibem bons filmes do ocidente, os apartamentos são grandes e luxuosos, a única coisa que não se consegue comprar é tinta vermelha.”

É assim que vivemos – temos todas as liberdades que queremos, mas falta-nos a tinta vermelha, a linguagem para articular a nossa ausência de liberdade. A forma como nos ensinam a falar sobre a guerra, a liberdade, o terrorismo e assim por diante, falsifica a liberdade. E é isso que estamos a fazer aqui: a dar tinta vermelha a todos nós.

Existe um perigo. Não nos apaixonemos por nós mesmos. É bom estar aqui, mas lembrem-se, os carnavais são baratos. O que importa é o dia seguinte, quando voltamos à vida normal. Haverá então novas oportunidades? Não quero que se lembrem destes dias assim: “Meu deus, como éramos jovens e foi lindo”.

Lembrem-se que a nossa mensagem principal é: temos de pensar em alternativas. A regra quebrou-se. Não vivemos no melhor mundo possível, mas há um longo caminho pela frente – estamos confrontados com questões realmente difíceis. Sabemos o que não queremos. Mas o que queremos? Que organização social pode substituir o capitalismo? Que tipo de novos líderes queremos?

Lembrem-se, o problema não é a corrupção ou a ganância, o problema é o sistema. Tenham cuidado, não só com os inimigos, mas também com os falsos amigos que já estão a trabalhar para diluir este processo, do mesmo modo que quando se toma café sem cafeína, cerveja sem álcool, gelado sem gordura.

Vão tentar transformar isto num protesto moral sem coração, um processo descafeinado. Mas o motivo de estarmos aqui é que já estamos fartos de um mundo onde se reciclam latas de coca-cola ou se toma um cappuccino italiano no Starbucks, para depois dar 1% às crianças que passam fome e fazer-nos sentir bem com isso. Depois de fazer outsourcing ao trabalho e à tortura, depois de as agências matrimoniais fazerem outsourcing da nossa vida amorosa, permitimos que até o nosso envolvimento político seja alvo de outsourcing. Queremo-lo de volta.

Não somos comunistas, se o comunismo significa o sistema que entrou em colapso em 1990. Lembrem-se que hoje os comunistas são os capitalistas mais eficientes e implacáveis. Na China de hoje, temos um capitalismo que é ainda mais dinâmico do que o vosso capitalismo americano. Mas ele não precisa de democracia. O que significa que, quando criticarem o capitalismo, não se deixem chantagear pelos que vos acusam de ser contra a democracia. O casamento entre a democracia e o capitalismo acabou.

A mudança é possível. O que é que consideramos possível hoje? Basta seguir os média. Por um lado, na tecnologia e na sexualidade tudo parece ser possível. É possível viajar para a lua, tornar-se imortal através da biogenética. Pode-se ter sexo com animais ou qualquer outra coisa. Mas olhem para os terrenos da sociedade e da economia. Nestes, quase tudo é considerado impossível. Querem aumentar um pouco os impostos aos ricos? Eles dizem que é impossível. Perdemos competitividade. Querem mais dinheiro para a saúde? Eles dizem que é impossível, isso significaria um Estado totalitário. Algo tem de estar errado num mundo onde vos prometem ser imortais, mas em que não se pode gastar um pouco mais com cuidados de saúde.

Talvez devêssemos definir as nossas prioridades nesta questão. Não queremos um padrão de vida mais alto – queremos um melhor padrão de vida. O único sentido em que somos comunistas é que nos preocupamos com os bens comuns. Os bens comuns da natureza, os bens comuns do que é privatizado pela propriedade intelectual, os bens comuns da biogenética. Por isto e só por isto devemos lutar.

O comunismo falhou totalmente, mas o problema dos bens comuns permanece. Eles dizem-nos que não somos americanos, mas temos de lembrar uma coisa aos fundamentalistas conservadores, que afirmam que eles é que são realmente americanos. O que é o cristianismo? É o Espírito Santo. O que é o Espírito Santo? É uma comunidade igualitária de crentes que estão ligados pelo amor um pelo outro, e que só têm a sua própria liberdade e responsabilidade para este amor. Neste sentido, o Espírito Santo está aqui, agora, e lá em Wall Street estão os pagãos que adoram ídolos blasfemos.

Por isso, do que precisamos é de paciência. A única coisa que eu temo é que algum dia vamos todos voltar para casa, e vamos voltar a encontrar-nos uma vez por ano, para beber cerveja e recordar nostalgicamente como foi bom o tempo que passámos aqui. Prometam que não vai ser assim. Sabem que muitas vezes as pessoas desejam uma coisa, mas realmente não a querem. Não tenham medo de realmente querer o que desejam. Muito obrigado.

Tradução de Luis Leiria para o Esquerda.net

15


Bansky

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Self-Help Philosopher


“A Questão Judaica” é uma questão tão provecta como o povo Judeu; já a “Questão Finkler” é tão ancestral como o povo Judeu, mas tem também a idade de Samuel Finkler, uma das personagens Rothianas do Romance de Howard Jacobson. Quem é Samuel Finkler? Finkler é um filósofo inglês, judeu, que, segundo o seu amigo Julian Treslove, encarna a forma mentis da natureza do povo eleito, levando-o a usar transnominalmente o nome Finkler para se referir a todos os judeus e a tudo o que presume judaico. Finkler estudou Filosofia e Ética em Oxford, ganha visibilidade com livros de self-help philosophy com títulos tão risíveis como “O existencialista na cozinha”, “O Guia Resumido do Estoicismo Doméstico”, e protagoniza programas "onde mostrava como Schopenhauer podia ajudar as pessoas na sua vida amorosa, Hegel na planificação das férias e Wittgenstein a decorar códigos pin”.
Com merecimento, a self-help philosophy já tem existência literária e o seu filósofo dilecto: Samuel Finkler.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Self-Help Philosophy


Expositores de bookstores, livrarias online, escaparates decrépitos, os livros “self- help” usurparam até as sisudas estantes da Sociologia e da Filosofia. O último, topado de raspanço ao lado do two-volume set de Derek Parfit, “On What Matters", na FNAC – 1440 páginas de retinta filosofia moral –, intitulava-se "Nietzsche para Stressados - 99 comprimidos de filosofia radical para as inquietações do dia-a-dia". Pareceu-me uma parelha bem emparelhada pelo rapazio livreiro da FNAC. Tomei o lexotan de quotio e fui-me à vida.

sábado, 8 de outubro de 2011

SeX Files - Sexo e Biopolítica Para Principiantes


Michel Foucault utilizou o termo "Biopolítica" para designar os dispositivos modernos que incluíram a “população”, enquanto categoria biológica, no âmbito dos cálculos explícitos levados a cabo pelo poder económico e político. Escreveu Foucault que “no âmago deste problema económico e político da população está o sexo: é preciso analisar a taxa de natalidade, a idade do casamento, os nascimentos legítimos e ilegítimos, a precocidade e a frequência das relações sexuais, a maneira de as tornar fecundas ou estéreis, o efeito do celibato ou dos interditos, a incidência das práticas contraceptivas”. O corpo erótico-sexual, energeia primigénita e força produtiva, é uma realidade biopolítica a gerir, porque «o controlo da sociedade sobre os indivíduos não se efectua somente pela consciência ou pelo ideológico, mas também pelo corpo e com o corpo.”
A inclusão da educação para a saúde e da educação sexual nas escolas, com o seu aparato legislativo e discursivo - pejado do locus amoenus dos "afectos" e sonegador do locus terribilis do prazer - cumpre, malgrado a inépcia, este intento. A sua ilusória neutralidade judicativa e valorativa relê Foucault: “O sexo não somente se julga, administra-se.”

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Prémio Ig Nobel da Literatura - Teoria do Adiamento Estruturado


Há um adágio indígena para os dias de trabalho fadigosos em que amontoamos, adiamos, diferimos, protelamos as tarefas impreteríveis, considerado-as sub specie aeternitatis - guarda para amanhã o que puderes guardar, o que não puderes, faz hoje, mas devagar. Vem isto a talhe de foice da atribuição do prémio Ig Nobel da Literatura ao filósofo da universidade de Stanford, John Perry, pela sua Teoria da Procrastinação Estruturada, expendida no artigo How to Procrastinate and Still Get Things Done.
Defende Perry que a essência da procrastinação consiste em pôr de parte as coisas que é necessário fazer, fazendo outras que impeçam que façamos as primeiras. Porque, em boa verdade, procrastinar não significa nada fazer, mas sim fazer coisas aparentemente inúteis que nos quitem da premência de fazer as úteis. Mas como tornar a procrastinação virtuosa e profícua? Defende Perry que o procrastinador poderá motivar-se para fazer as tarefas importantes e necessárias, na medida em que estas tarefas forem uma maneira de não fazer outras ainda mais importantes. E como realizar tal coisa? Estruturar um esquema hierárquico e dinâmico de tarefas, da mais urgente para a menos importante, de modo que a realização das tarefas menos urgentes, mas ainda assim importantes, nos desobrigue das tarefas de nível superior.
O esquema é piramidal e deceptivo porque pressupõe que, num dado momento, as tarefas de topo, impreteríveis, sejam sempre preteridas por outras, percepcionadas como menos importantes ou inúteis, mas mais interessantes. Ora, em rigor, tal não deve ser considerado como demérito da Teoria, porque, amiúde, as tarefas julgadas indiferíveis não o são na realidade.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

15




o protesto internacional do 15 de outubro não contará com a publicidade dos meios de comunicação social mainstream. todos os cartazes propostos para a divulgação do protesto são um convite à 'auto-campanha' - divulga, publica online, partilha, imprime os que puderes, cola nas paredes da tua cidade, deixa no café. este é o teu protesto. passa palavra.
Aqui.

domingo, 2 de outubro de 2011

Théorie de la Jeune Fille


Já tínhamos alvitrado que a reflexão sobre temas e ícones da "Cultura Popular" é o novo modismo philo. É possível, sem grandes delongas exploratórias, ouvir Žižek perorar sobre o filme Matrix, ver o matemático, filósofo e tintinólogo Michel Serres consagrar uma obra a Hergé, ou ler o devotamento enófilo de Roger Scruton no seu livro I Drink Therefore I Am.
Alguma filosofia contemporânea está possuída por um impetus micrológico, que a impele a um labor de filigrana conceptual sobre ninhices de grande relevância filosófica. Um impetus micrológico que, aliás, impulsiona quer o tecnicismo da tradição analítica (em que um paperzinho sobre as minudências das modalidades de Dicto e de Re pode ser tão relevante como a grande síntese sobre a Secularização, de Charles Taylor), quer a flânerie intelectual de alguma filosofia francesa, que não se deixa maravilhar nem pelo céu estrelado nem pela lei moral dentro de si.

Pierre Péju é escritor e colaborador da revista francesa Philosophie, escrevendo habitualmente e com proficiência sobre a infância. É também um especialista na Théorie de la Jeune Fille, à qual consagrou uma conferência que vem publicada no número de Setembro. De Helena de Tróia e Diana - deusa da caça que se vegetaliza para se furtar ao desejo – até ao dealbar dos anos 2000 em que a rapariga jovem se transforma numa princesa pós-moderna e signo da mercantilização generalizada, eis a a filosofia na sua deriva micrológica. Roland Barthes iria adorar.

sábado, 1 de outubro de 2011

Internacional Citacionismo



Há lá coisa mais excitante do que o lugar-comum

Baudelaire

Ler, Ver e Ouvir a Guerra



Em 1929, Ernest Miller Hemingway publicou A Farewell to Arms.
Em 1979, Francis Ford Coppola mostrou-nos Apocalypse Now.
Em 2011, Polly Jean Harvey editou o seu oitavo álbum, Let England Shake.


On Battleship Hill lyrics
Songwriters: P.j. Harvey

The scent of Thyme carried on the wind
Stings my face into remembering
Cruel nature has won again
Cruel nature has won again

On Battleship Hills caved in trenches
A hateful feeling still lingers
Even now 80 years later
Cruel nature, cruel, cruel nature

The land returns to how it has always been
Thyme carried on the wind
Jagged mountains, jutting out
Cracked like teeth in a rotten mouth

On Battleship Hill I hear the wind
Say, "Cruel nature has won again"
Cruel nature has won again
Cruel nature has won again
Cruel nature has won again